Crianças
em idade pré-escolar são capazes de tirar conclusões com base em
análises estatísticas. Elas também aprendem por experimentos individuais
e observação dos colegas. Essas são as características que levaram a
pesquisadora Alison Gopnik, do Departamento de Psicologia da
Universidade da Califórnia em Berkeley, a concluir que os pequenos têm
uma maneira de pensar e aprender muito similar à dos cientistas.
A constatação, que enfatiza a importância das experiências vividas
pelas crianças de até 6 anos, pode ter implicações na maneira como se
estrutura o ensino infantil. Para se chegar a esse resultado, publicado
na última edição da revista Science, Alison fez uma revisão de dezenas
de pesquisas anteriores que avaliaram os mecanismos de pensamento das
crianças pequenas.
Ela defende que as crianças, mais do que os adultos, são capazes de
propor teorias incomuns para resolver problemas. “Esse tipo de
pensamento hipotético reflete sobre o que poderia acontecer, e não sobre
o que realmente aconteceu. E esse é um tipo de pensamento muito
poderoso que usamos na ciência”, diz Alison. Ela completa que a própria
brincadeira de faz de conta, aquela atividade espontânea em que as
crianças costumam se engajar, é “uma reflexão sobre esse raciocínio e
compreensão profundos”.
Mas como é possível saber que crianças pequenas ou até bebês, que
ainda nem têm a fala desenvolvida, tenham a capacidade de fazer análises
estatísticas? A resposta vem de experimentos recentes que têm testado a
capacidade reflexiva de crianças cada vez mais novas.
Em um deles, por exemplo, bebês de 8 meses mostram-se surpresos
quando o pesquisador retira de uma caixa cheia de bolas brancas,
contendo apenas algumas bolas vermelhas, uma amostra com a maioria de
vermelhas e poucas brancas. Alison observa em seu artigo que é como se
os bebês dissessem: “Aha! A probabilidade de isso ter ocorrido por acaso
é menor que 0,05”.
Uma das pesquisadoras que atualmente se dedica a essa abordagem é a
psicóloga Fei Xu, do Laboratório de Cognição e Linguagem Infantis da
Universidade da Califórnia em Berkeley. “Em situações da vida real,
estamos sempre em situações de incerteza. Então temos de pensar qual é a
probabilidade de algo acontecer”, explica a cientista. “Queremos saber
se os bebês têm essa habilidade de raciocínio mesmo antes do aprendizado
da linguagem.”
Outras experiências citadas por Alison foram bem sucedidas em
demonstrar que crianças também aprendem com suas experimentações
individuais, que surgem em meio às brincadeiras, e ainda observando seus
colegas. Os mesmos procedimentos utilizados pelos cientistas.
Nova visão
No passado, o entendimento sobre o raciocínio das crianças pequenas
era de que elas eram seres ilógicos e só concebiam o aqui e o agora.
Hoje, as escolas levam em conta sua capacidade de experimentação.
Segundo a psicopedagoga Quézia Bombonato, presidente da Associação
Brasileira de Psicopedagogia, existe a construção do conhecimento e não a
simples transmissão de informação. “É o ato de fazer que, do ponto de
vista neurológico, faz com que o conhecimento saia do sistema límbico,
de memória a curto prazo, e vá para o córtex, que corresponde à
aprendizagem efetiva.”
A educadora Priscila Cantieri, coordenadora de Educação Infantil da
Escola Santi, observa que a visão da infância hoje é muito diferente da
que se via algumas décadas atrás. “Acreditava-se que a criança era uma
tábula rasa e que a gente tinha que transmitir todo o conhecimento para
ela”, diz. “Hoje, a escola sempre inicia o conteúdo descobrindo o que as
crianças pensam sobre o tema.”
Para a educadora Roberta Bastos Ganan, do Colégio Humboldt, a
capacidade de aprender com os colegas também é valorizada nas aulas.
“Criamos pequenos grupos para discutir determinado assunto, em que cada
um expõe sua opinião e busca chegar a algum consenso.”
Para Alison, deve-se considerar que crianças em idade pré-escolar são
cientistas naturais, para ajudá-los a entender os princípios da ciência
formal. “A própria ciência pode ajudar a transformar a curiosidade e o
brilho naturais da criança em melhor ensino e aprendizado.”
O educador Silvio Barini Pinto, diretor do Colégio São Domingos, faz
um contraponto a essa ideia. “Ao trazer o método científico para a pauta
da educação de crianças, penso que se promove uma precipitação que pode
embotar as experiências sensíveis, tão relevantes no desenvolvimento
psicossocial.” As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário